O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e relator da proposta sobre a Lei do Marco Temporal, Gilmar Mendes, divulgou a primeira proposta de alteração do texto da Lei 14.701/2023, que trata da demarcação das terras indígenas.
A minuta estabelece que a demarcação não dependerá da comprovação de ocupação indígena em 5 de outubro de 1988 – tese conhecida como marco temporal – ou da configuração de renitente esbulho (disputa possessória em que indígenas teriam sido expulsos de suas terras).
O texto será analisado pela Comissão Especial em reuniões previstas para os dias 17 e 24 de fevereiro, podendo sofrer ajustes para conciliar os interesses do agronegócio e dos povos indígenas. Após essa etapa, o texto ainda precisará ser aprovado na Câmara dos Deputados e no Senado Federal antes de sua implementação.
Terras ocupadas por não indígenas
A proposta define terras indígenas como aquelas:
- Habitadas permanentemente pelas comunidades indígenas;
- Utilizadas para atividades produtivas que garantam sua subsistência;
- Essenciais para a preservação dos recursos ambientais necessários ao bem-estar dessas comunidades;
- Necessárias à reprodução física e cultural dos povos indígenas, em conformidade com seus usos, costumes e tradições.
Se uma terra em processo de demarcação estiver sendo ocupada por não indígenas, será iniciado um processo de diálogo para discutir a aplicação de medidas compensatórias ou indenizatórias. Para que a compensação ocorra, será necessário comprovar a posse não indígena ininterrupta e anterior a 5 de outubro de 1988 – data da promulgação da Constituição Federal.
Processo de demarcação
A minuta prevê que o processo de demarcação será público e contará com ampla divulgação eletrônica em todas as fases.
As etapas incluem:
- Abertura do processo administrativo mediante solicitação formal do grupo indígena à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai);
- Formação de grupo técnico para realizar estudos e elaborar o Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação (RCID);
- Análise do relatório pela Funai e pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP);
- Homologação da demarcação por decreto do Presidente da República.
Exploração econômica
O documento também regulamenta a exploração econômica das terras indígenas. A decisão sobre quais áreas poderão ser exploradas será de responsabilidade do Presidente da República, com base em estudos técnicos e após consulta formal às comunidades indígenas afetadas.
Além disso, será necessária a autorização do Congresso Nacional, e as comunidades indígenas terão direito a participar do processo e receber compensações financeiras pela exploração de recursos minerais em suas terras.
Histórico da disputa
A disputa em torno do Marco Temporal ganhou força em 2023, quando o STF declarou a tese inconstitucional, por considerar que a restrição temporal violava os direitos originários dos povos indígenas.
Em resposta, o Congresso Nacional aprovou em sentido contrário a Lei 14.701/2023, que restabelecia o marco temporal, provocando novas ações judiciais para questionar sua validade.
Diante do impasse, o ministro Gilmar Mendes propôs a criação de uma mesa de conciliação, que já realizou 15 encontros entre representantes do governo, do agronegócio e dos povos indígenas para buscar uma solução equilibrada.