Em resposta ao início da vigência das tarifas de 50% impostas pelos Estados Unidos sobre produtos brasileiros, o presidente Lula (PT) declarou, em entrevista à Reuters, que buscará um alinhamento com líderes do BRICS para discutir uma resposta coletiva ao que classificou como uma medida unilateral de Donald Trump, cujo objetivo, em sua visão, seria enfraquecer o multilateralismo e impor pressões políticas sobre países emergentes.
“Vou tentar discutir com eles sobre como cada um está nesta situação, quais são as implicações para cada país, para que possamos tomar uma decisão”, afirmou.
Segundo o presidente, a prioridade é dialogar com primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, que também foi alvo de uma tarifa extra de 25% anunciada por Trump pelo fato de importar petróleo russo, o que elevou o total de tarifas à Índia para 50%. Depois, conversará com o presidente da China, Xi Jinping, a fim de entender os impactos e coordenar uma reação do bloco diante da escalada protecionista dos EUA. Além de Brasil, Índia e China, outros membros do BRICS também estariam sendo prejudicados pelas sanções de Washington. A África do Sul, no momento, está com tarifas de 30%.
“Ele [Trump] quer desmontar o multilateralismo, onde os acordos são feitos coletivamente dentro das instituições, e substituir pelo unilateralismo, no qual ele negocia individualmente com outros países”, disse Lula.
Brasil não pretende adotar reciprocidade
Lula destacou que, diferentemente de Trump, não pretende adotar tarifas recíprocas contra produtos norte-americanos, pois “não quer brigar” e quer mostrar que o Brasil aposta no diálogo e no multilateralismo.
“Não vou fazer porque não quero ter o mesmo comportamento do presidente Trump. Porque quando um não quer, dois não brigam. E eu não quero brigar com os Estados Unidos”, declarou.
O presidente afirmou que só ligará para Donald Trump se houver abertura real para negociação: “No dia em que minha intuição disser que ele quer conversar, vou ligar, mas não vou me humilhar”. Ele também comentou que a atual é a pior crise das relações Brasil-EUA em 200 anos, agravada por uma “atitude autoritária” dos norte-americanos ao comunicarem a taxação sem qualquer abertura para diálogo ou negociação.
“Nós acreditamos que um país que tem 201 anos de relação diplomática muito civilizada não vai jogar isso fora por causa, muitas vezes, de uma atitude destemperada de um presidente”, disse.
O Brasil, de acordo com Lula, está focado em ajudar empresas a buscar novos mercados e alternativas para manter o nível de emprego, ao mesmo tempo em que o governo já acionou a Organização Mundial do Comércio (OMC) sobre o tarifaço, apesar de reconhecer que a chance de sucesso do contencioso seja baixa.
Questão de Jair Bolsonaro
Lula também reforçou que parte da responsabilidade pela retaliação dos EUA reside na “atuação da família Bolsonaro”, especialmente do ex-presidente e de Eduardo Bolsonaro, que, segundo ele, teriam incitado Trump a adotar sanções políticas e econômicas contra o Brasil. Lula chamou tal conduta de “traição à pátria”, e afirmou que Jair Bolsonaro e seu filho deveriam responder por novos processos judiciais, já que teriam influenciado Trump a aplicar sanções por motivações políticas e pessoais.
“Ele [Trump] que cuide dos Estados Unidos. Do Brasil, cuidamos nós. Só tem um dono nesse país. E só um dono: o mandato do presidente da República é do povo. O povo que elegeu, o povo que pode tirar”, declarou.
Por fim, Lula destacou que o Supremo Tribunal Federal age de forma soberana e independente, sem qualquer interferência estrangeira, e avaliou que Trump tenta, com as tarifas, interferir “inadmissivelmente” na soberania nacional. O presidente destacou que não tem “nada contra” o colega estadunidense, e que pode se encontrar com o mesmo na Assembleia Geral da ONU, em setembro.

