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Análise: Megaoperação contra o crime coloca Lula na defensiva e remobiliza a direita

O momento é desfavorável a Lula, que, a partir de agora, terá de recalcular a rota da narrativa e de projetos setoriais

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O impacto da megaoperação policial de combate ao crime organizado realizada na terça-feira passada (28) no Rio de Janeiro, que resultou em cerca de 120 mortos, tornou-se o mais letal enfrentamento à criminalidade no país e mudou o curso da agenda política nacional. Como a segurança pública é considerada a prioridade número 1 dos eleitores, a megaoperação, sob o comando do governador fluminense, Cláudio Castro (PL), transformou-se em tema nacional.

Nas primeiras horas após a operação, o foco da imprensa – e da opinião pública –, esteve direcionado para as críticas ao embate, devido sobretudo ao elevado número de mortos. Essa abordagem, porém, foi mudando nos dias posteriores. Ainda que o número de mortes permaneça nas manchetes dos noticiários, ganharam espaço a problemática do terror imposto pelo crime organizado às comunidades, a necessidade de o Estado retomar o território sob o comando das facções e o impressionante número de fuzis apreendidos na ocasião – mais de 90.

A mudança no clima da opinião pública contribui para fortalecer a posição de Cláudio Castro. Mais do que agendar o tema da segurança pública como a pauta do país, Castro recebeu o respaldo declarado dos seguintes governadores, todos opositores do governo Lula: Romeu Zema (Novo-MG); Jorginho Mello (PL-SC); Ronaldo Caiado (UB-GO); Eduardo Riedel (PP-MS); e Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP). Em um encontro no Rio de Janeiro, eles anunciaram a criação de um Consórcio da Paz.

Pelo tom crítico adotado em relação ao governo federal, a centro-direita, aproveitando a repercussão da megaoperação de combate ao crime organizado, deve reverberar o tema para desgastar o presidente Lula (PT) na segurança pública. Note-se que, embora a cartada de Cláudio Castro tenha sido de alto risco político, ele conseguiu remobilizar a direita.

Tal reviravolta também tem sido possível pelos erros cometidos pelo Palácio do Planalto. Lula, nas horas seguintes à megaoperação, optou por submergir. Mesmo estando em viagem ao exterior, quando ocorrem eventos de grande impacto espera-se que o presidente, como líder máximo do país, mostre sua liderança e se comunique diretamente com a população. O que se viu foi Lula sem timing e seus interlocutores escolhendo o caminho da isenção de responsabilidade. O governo federal, equivocadamente, procurou restringir o tema à competência do governador do Rio de Janeiro, quando o assunto já dominava a agenda do país.

Após ficar na ofensiva, o governo federal recuou. Somente na quarta-feira (29/10), um dia após a megaoperação, Lula divulgou uma mensagem no X defendendo o combate ao crime organizado. Paralelamente, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, ao lado de Cláudio Castro, anunciou a criação do Escritório de Emergência de Combate ao Crime Organizado. Em outro movimento institucional, o governo federal publicou, nas redes sociais, um vídeo mencionando suas ações na Operação Carbono Oculto, que foi deflagrada em agosto e atingiu o coração financeiro do Brasil – a Faria Lima, em São Paulo. No entanto, até o momento, não está prevista uma ida do presidente ao Rio, nem mesmo um pronunciamento em cadeia nacional.

Buscando reagir à crise, Lula sancionou (30/10) a lei, de autoria do senador Sergio Moro (UB-PR), que promove mudanças na legislação penal com o intuito de fortalecer o combate ao crime organizado. No âmbito do Congresso será apresentado, nesta semana, o projeto do deputado federal licenciado, atual secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite (PP), que equipara facções criminosas a grupos terroristas. Também será instalada a CPI do Crime Organizado nesta terça-feira (04).

A repercussão da megaoperação no Rio de Janeiro deixa ainda mais evidente a forte politização em torno do tema da segurança pública, devido à proximidade com as eleições de 2026. Tais embates devem permanecer e escalar. Por ora, o momento é desfavorável a Lula, que viu a repercussão positiva do encontro com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ficar em segundo plano em termos de exposição midiática e social.

A depender da intensidade sobre a percepção do sentimento que questiona as respostas até então dadas pelo governo federal, o presidente poderá ter sua popularidade impactada negativamente. O problema central de Lula é que a esquerda possui uma visão crítica da ocupação de território por parte da polícia, enquanto a visão preponderante da sociedade pende para a chamada “política linha-dura” de combate ao crime.

A alavancagem da agenda da segurança se desdobra, portanto, num novo desafio para Lula, que, a partir de agora, terá de recalcular a rota da narrativa e de projetos setoriais para buscar distensionar as pressões que incidem sobre o governo federal.

Autor

  • Analista Político da Arko Advice. Doutorando em Ciência Política na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Mestre em Comunicação Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Bacharel em Ciência Política (ULBRA-RS). Especialista em Ciência Política (UFRGS). Tem MBA em Marketing Político (Universidade Cândido Mendes).

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