O impasse político que o país vive, consequência de fatores como as sanções impostas ao Brasil pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, as dificuldades encontradas pelo governo brasileiro na negociação com Washington e a aposta no conflito político por setores do bolsonarismo, deve permanecer na agenda.
Na semana passada, a reunião entre o secretário do Tesouro americano, Scott Bessent, e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), na qual se discutiria o tarifaço aplicado pelos Estados Unidos, foi cancelada por conta da atuação do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) na Casa Branca.
Os Estados Unidos também anunciaram o cancelamento do visto de diversas autoridades brasileiras que atuavam no programa Mais Médicos. O Departamento de Estado americano divulgou ainda um relatório em que afirma que a situação dos direitos humanos no Brasil teria piorado ao longo de 2024 e citou o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Além disso, Donald Trump classificou o Brasil como um “péssimo parceiro comercial” e classificou o processo judicial contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de “execução política”.
Também na semana passada, em entrevista à BBC Brasil, Eduardo Bolsonaro indicou que a pressão americana contra o Brasil não cessará. O deputado não descartou sanções aos presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), caso não avancem no Congresso Nacional as discussões sobre o projeto de anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro de 2023 e sobre o processo de impeachment contra o ministro Alexandre de Moraes.
A aposta de Eduardo Bolsonaro no conflito deve ampliar seu desgaste e afastar do bolsonarismo os partidos de centro. Não à toa, na última sexta-feira (15) Hugo Motta enviou ao Conselho de Ética da Câmara pedidos de cassação do mandato de Eduardo.
O modus operandi de Eduardo também intensifica uma divisão na direita, já que o deputado acabou expondo publicamente suas divergências com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), o nome preferencial dos agentes econômicos para a sucessão presidencial em 2026. Ainda na entrevista à BBC Brasil, Eduardo disse que Tarcísio, ao contrário dele próprio, ainda acha que é possível dialogar com o ministro Alexandre de Moraes.
O clima de tensão política também traz desgastes para o presidente Lula (PT). A mais recente pesquisa Ipsos-Ipec (12/08) apontou que 62% dos entrevistados entendem que Lula não deve disputar um novo mandato. E que 51% acreditam que o presidente não fez tudo o que deveria para evitar o tarifaço imposto por Trump.
Esses números indicam que somente a narrativa da defesa da soberania, sem a realização de ações concretas por parte do governo, pode não trazer os resultados esperados por Lula. Não por acaso, na semana passada, o governo anunciou a liberação de R$ 30 bilhões, por meio de medida provisória, para ajudar as empresas exportadoras prejudicadas pelo tarifaço.
Outro aspecto a ser observado é que, de acordo com o instituto AtlasIntel, embora a maioria dos entrevistados se posicione contrária à tese bolsonarista da “anistia ampla, geral e irrestrita” aos envolvidos no 8 de janeiro, a prisão de Jair Bolsonaro divide a opinião pública. O AltasIntel captou ainda um desgaste na imagem do próprio Supremo.
Mesmo diante da iminente condenação de Jair Bolsonaro, o que deve levar o ex-presidente a cumprir pena em regime fechado, o discurso da “perseguição política” e o embate com o STF viabilizaram uma narrativa para o bolsonarismo no pior momento de seu grande líder.
Ainda que a condenação de Bolsonaro tenha poucas possibilidades de ser evitada, bem como a anistia nos moldes defendidos pelo bolsonarismo, chamou atenção, na última quinta-feira (14), o fato de o presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab, afirmar que o projeto de anistia não é uma “aberração” e pode ser debatido no Congresso. De acordo com Kassab, porém, no momento o modelo de anistia “ampla, geral e irrestrita” defendido pela oposição “não é positivo para o Brasil”.
Manifestações como a de Kassab indicam uma preocupação com o impasse político que vivemos. No entanto, a busca por uma solução negociada é, por ora, improvável. Além da oposição ao STF, já que Bolsonaro está próximo da condenação, não há ambiente político favorável a uma anistia para o ex-presidente.
Nesse impasse político, todos perdem. O saldo de popularidade de Lula segue negativo. A rejeição ao bolsonarismo tem aumentado. O Supremo está com sua imagem desgastada. Sem falar no impacto econômico do tarifaço no Brasil.