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Análise: Direita sem rumo

Mesmo que falte mais de um ano para a sucessão, o timing desafia a oposição

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Três movimentos ocorridos na semana passada podem ser interpretados como sintomas da falta de rumo da oposição a um ano da sucessão presidencial:

1) A declaração da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (PL) de que vai se “erguer como uma leoa para defender os valores conservadores”, admitindo a possibilidade de concorrer a presidente da República em 2026;

2) O surgimento de rumores de que o governador de São Paulo (SP), Tarcísio de Freitas (Republicanos), teria desistido de concorrer a presidente, reafirmado o desejo de tentar a reeleição ao Palácio dos Bandeirantes e;

3) A possibilidade de o centrão dar andamento à candidatura do governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), à Presidência, como alternativa a Tarcísio.

Embora seja visto por parte significativa do centrão e do setor produtivo como “o melhor” candidato da direita para concorrer com o presidente Lula (PT) nas eleições do próximo ano, Tarcísio enfrenta obstáculos desde julho, quando entrou em vigor o tarifaço dos Estados Unidos contra o Brasil, após articulações do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) junto ao governo Donald Trump.

Tarcísio de Freitas, ao tentar uma aproximação com os Estados Unidos ao lado de setores do empresariado paulista, irritou Eduardo Bolsonaro. Além das divergências com Eduardo, Tarcísio transformou-se em alvo do Palácio do Planalto, que passou a explorar uma foto do governador paulista com o boné de campanha de Trump, em 2024.

Pressionado, Tarcísio optou por um gesto ao bolsonarismo no evento do dia 7 de setembro: criticou o Supremo Tribunal Federal (STF) e atuou em favor da anistia. Esses movimentos desgastaram Tarcísio, que, desde então, adotou um recuo tático. Além de preservar-se nacionalmente, o governador tem reafirmado sua posição de candidato à reeleição para evitar disputas em sua base.

Embora continue no jogo sucessório, Tarcísio passa por um momento adverso, em consequência da resistência a seu nome por parte de Eduardo Bolsonaro. Outro desafio de Tarcísio de Freitas é o posicionamento. Ainda que tenha uma relação política com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), Tarcísio é um quadro político de direita, mas não um bolsonarista raiz. Para conquistar o apoio de expoentes mais radicais como Eduardo Bolsonaro, precisa fazer gestos a esse núcleo. No entanto, ao realizar tais movimentos, pode distanciar-se do centro.

Mesmo que Eduardo diga que será candidato a presidente se Jair Bolsonaro, seu pai, estiver fora da disputa, o deputado do PL teve quatro reveses significativos na última semana: 1) o gesto do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ao presidente Lula (PT) na Assembleia-Geral da ONU, abrindo espaço para um possível diálogo entre os dois países; 2) a denúncia feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Eduardo por coação à Justiça; 3) o indeferimento do nome de Eduardo como Líder da Minoria pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e; 4) a instauração de processo pelo Conselho de Ética da Casa contra Eduardo por quebra de decoro parlamentar.

Eduardo enfrenta críticas até mesmo no PL. Na semana passada, a imprensa noticiou que Jair Bolsonaro estaria contrariado com o fato de seu filho estar “falando demais”. A divisão na oposição também provoca divergências no debate em torno da anistia. A bandeira bolsonarista da “anistia ampla, geral e irrestrita” perdeu força após as novas sanções dos Estados Unidos contra o Brasil – na semana passada, Viviane Barci de Moraes, esposa do ministro Alexandre de Moraes, do STF, foi incluída na Lei Magnitsky. Além de Viviane, o ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias, teve seu visto revogado.

As novas sanções e os obstáculos nas negociações em torno do texto com as bancadas e o Senado levaram o relator do PL da Anistia, deputado Paulinho da Força (SD-SP), a admitir que a votação do projeto pode ser adiada. O PL da Anistia, que deve ser transformado em PL da Dosimetria, deve abrir um novo foco de divisão na direita.

O impasse na direita não deve ser resolvido no curto prazo. Como Jair Bolsonaro está em prisão domiciliar, é possível que postergue a escolha de seu sucessor para preservar o próprio capital político. Assim, é improvável que o candidato da direita à Presidência em 2026 seja definido antes do fim deste ano.

Mesmo que falte mais de um ano para a sucessão, o timing desafia a oposição. Para assumir o posto de candidato ao Palácio do Planalto, Tarcísio de Freitas precisaria: desincompatibilizar-se do cargo de governador em abril de 2026 para concorrer; obter o apoio do clã Bolsonaro; articular sua sucessão em São Paulo; unir a oposição para trocar uma reeleição relativamente tranquila no estado pelo projeto nacional. Caso essa construção não prospere, aumenta a possibilidade de a direita continuar dividida.

No entanto, a direita ainda tem tempo para buscar solucionar seus problemas internos. E não devemos descartar a possibilidade de, em algum momento, o pragmatismo prevalecer tendo como ponto de convergência a necessidade de viabilizar um nome que faça frente a Lula.

Autor

  • Analista Político da Arko Advice. Doutorando em Ciência Política na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Mestre em Comunicação Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Bacharel em Ciência Política (ULBRA-RS). Especialista em Ciência Política (UFRGS). Tem MBA em Marketing Político (Universidade Cândido Mendes).

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