Rodrigo Bacellar (União), presidente da Alerj e pré-candidato ao governo do Estado do Rio de Janeiro nas eleições de 2026, vem tocando as pautas legislativas sem estabelecer diálogo direto com o governador Cláudio Castro (PL). Para tanto, tem contado muito com o apoio do líder do governo na Casa Legislativa, Rodrigo Amorim (União) – o (in)fiel da balança.
Caso ilustrativo mais recente ficou evidenciado na sanção da Lei Complementar nº 224 de 22 de outubro de 2025, que trata de alterações na Lei Orgânica da Polícia Civil, ocasião na qual Castro vetou a parte que previa, dentre outras gratificações, a “faroeste” para policiais que matarem criminosos em confrontos e apreenderem armamento – pontos estes capitaneados por Rodrigo Amorim, que contou com apoio de Bacellar e de outros deputados que compõem a “bancada da bala”.
Em evento público, ao comunicar sua decisão, Castro disse: “Espero que, à luz da boa técnica legislativa, sejam mantidos os vetos pela Assembleia Legislativa”. O veto de Castro sobre a “gratificação faroeste” buscou respeitar tanto o princípio da economicidade, visto que o orçamento estadual é deficitário, quanto decisões anteriores do Supremo Tribunal Federal no contexto de combate a letalidade policial. No entanto, Amorim e Bacellar vão ignorar as manifestações e já acertaram alinhamento para vencer o veto de Castro.
A dobradinha entre Amorim e Bacellar também ditará novos rumos em projetos do governador que estão em tramitação na Alerj e versam sobre a Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros. O que se vê é Amorim apropriando-se do discurso de defesa aos interesses do governo para impor seu modo de governança.
Por outro lado, na mesma Lei Complementar, Castro conservou trecho adicionado na Alerj que trata do impedimento para que delegados de polícia possam assumir função de comando de qualquer tipo de força de policiamento ostensivo e comunitário, sob pena de caracterizar desvio de função e violação à autonomia institucional.
Esse ponto, especificamente, transcende a disputa interna de atores da direita e alcança o principal opositor nas eleições 2026, Eduardo Paes (PSD). Isso porque, o pré-candidato de oposição ao governo nomeou o delegado da polícia civil Brenno Carnevale, até então secretário municipal de Ordem Pública, como diretor-geral da recém-criada Divisão de Elite da Guarda Municipal (GM-Rio). Importante registrar que Rodrigo Amorim, em ato contínuo à sanção da Lei Complementar, encaminhou ofício ao secretário estadual da Polícia Civil, Felipe Curi, pedindo o retorno do delegado aos quadros da corporação.
Não obstante ao movimento orquestrado, ao menos por ora, o tiro parece ter saído pela culatra, pois, na última sexta-feira (24), o desembargador Carlos Eduardo da Fonseca Passos, do Tribunal de Justiça do Rio, concedeu uma liminar contra o dispositivo, atendendo uma representação de inconstitucionalidade apresentada pelos deputados Luiz Paulo (PSD) e Martha Rocha (PDT), aliados de Paes.
Diante o imbróglio, nova frente de disputa política foi aberta: transcendendo do campo da segurança pública para o campo de futebol.
A bola da vez é o Estádio do Maracanã e o pano de fundo é o “Clássico dos Milhões”, que envolve o tradicional confronto entre os clubes Flamengo e Vasco. Mais especificamente, os times de coração de Bacellar (Flamengo) e Paes (Vasco).
O contexto da nova disputa se dá no âmbito de um dos projetos que compõe o pacote fiscal enviado por Castro à Alerj e trata da alienação de imóveis para que o governador possa leiloá-los e acumular receita que ajude na amortização da dívida estadual com a União e, por consequência, viabilize a adesão ao Propag em condições mais favoráveis.
A sagacidade política e futebolística de Bacellar o fez perceber o afago de Paes à torcida do Flamengo – maior eleitorado do futebol – ao destravar o impedimento que havia sob a cessão de um terreno cobiçado para que o Flamengo pudesse construir, a priori a partir de 2026, seu novo Estádio. Paes postou em suas redes sociais sinalizando que a decisão sobre o futuro do Estádio “depende apenas do clube” e, com isso, mostrou-se capaz de superar o clubismo para defender interesses maiores. Afinal, o projeto do novo Estádio prevê ações de fortalecimento na integração entre as zonas portuária, central e norte da cidade do Rio de Janeiro.
Bacellar, com ajuda da sua tropa de elite, não poderia deixar o nome de Paes marcado na história de seu clube de coração e, como pronta resposta, tratou de propor a inclusão do Maracanã na lista dos imóveis a serem alienados via projeto de lei complementar. O estádio está avaliado em cerca de R$ 2 bilhões e, naturalmente, o movimento foi visto com bons olhos tanto pela direção do Flamengo quanto por sua torcida – além de ser menos custoso, encurta o tempo da entrega e traz, sobretudo, muita simbologia.
A matéria será votada em Plenário no curto prazo e, a consumação da venda/compra do Maracanã enfrentará obstáculos técnicos, visto que atualmente o Estádio é administrado pelo consórcio formado por Flamengo e Fluminense, que tem concessão até 2044.
Não é de hoje que futebol e política se misturam.

